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Uma lenta reflexão sobre o tempo

Tudo começou de forma lenta, porém profunda quando as algemas de ouro e todos os benefícios adjacentes a ela de um trabalho por carteira assinada no glamour do corporativo multinacional se soltaram e comecei a engatinhar no universo da mentoria e consultoria. Precisava precificar meu trabalho, e normalmente neste contexto, isso é diretamente relacionado às horas investidas para entregar o produto final previamente combinado. O produto final, contudo, não é só aquela horinha de reunião ou o processo contínuo de produzir e revisar intermináveis ppts.

O produto final é resultado de outras incontáveis horas de estudo, experiência e prática de uma vida. Ele é resultado de quem eu sou, da minha visão de mundo e da intenção que existe como pano de fundo do que desejo entregar além do contratado.

Então, quanto vale meu tempo?

Beeeeem lá antigamente a nossa percepção de tempo estava ligada aos ciclos da natureza, nascer e pôr do sol, fases da lua, verão, inverno, plantio e colheita. Até que inventamos o relógio solar e nos achamos capazes de controlá-lo pelo simples fato de conseguir contá-lo. Para Newton o tempo é linear e constante, para Eistein, relativo, para o meu pai, não tem caminho de volta. Para muitos por aí, tempo é dinheiro.

Para mim, tempo é vida, minha vida e o que eu faço com ela desde que abro meus olhos pela manhã até adormecer e novamente, abrir meus olhos no dia seguinte e eventualmente esse ciclo parar de acontecer.

Ultimamente tenho percebido o tempo a partir do estudo das Nações Unidas que teríamos somente mais 60 colheitas até o solo superficial ser completamente devastado. Isso equivale dizer que teremos somente 60 anos com comida se não fizermos nada para mudar o modo atual que manejamos o solo. Eles disseram isso há alguns anos, com sorte, nos restam 50 anos.

Não é historinha que seu filho vai ver, nós já estamos vendo. Para algumas pessoas esta realidade de desertificação e consequente falta de comida e água já é o presente mais que indesejado. Me parece que o tempo passa devagar para essas pessoas que tem pressa para sobreviver.

Do lado de cá, onde ainda há água saindo pelas torneiras – cada vez mais cara e racionada – e varejos com prateleiras lotadas – de ofertas em sua maioria, supérfluas – vivemos não só a gourmetização da correria como incentivamos a sensação do “Fear Of Missing Out” ao perpetuar essa necessidade insana de nos atualizar constantemente a respeito das inovações mais disruptivas.

Estamos correndo atrás de que mesmo afinal? Em um tempo em que nada nem ninguém é suficiente, em que a tecnologia dita o que devemos aprender e quem devemos ser, nos é imposto um ritmo desenfreado justamente a fim de perdermos o contato com os ciclos naturais e nosso verdadeiro ser. Ficamos como cachorros correndo atrás do rabo, felizes com biscoitinhos esporádicos.

A angústia provocada por essa sensação de insuficiência faz crescer o número de pessoas que prefere terminar voluntariamente com seu tempo. A cada 45 minutos ocorre um suicídio no Brasil segundo um grupo de trabalho da Câmara dos Deputados realizado em 2021. Seria simplesmente falta de capacidade de adiar satisfação? Ou seria uma completa desconexão com o sentido de existir neste tempo digital?

E de repente ficou mais evidente algo que nunca deveria ter me esquecido. O meu tempo é medido não somente pelo resultado que vou alcançar ou pelo produto que será entregue. Ele passou a valer mais do que nunca o que se constrói pelo caminho.

Agora com um pouco mais de consciência, a maioria das brigas que comprei (não foram poucas), dos projetos que aceitei, dos caminhos que escolhi foram simplesmente por não conseguir desperdiçar meu tempo para agradar e avançar na carreira. Fiz porque não conseguiria fazer de outro jeito. Errei muitas vezes e me arrependo de outras tantas, mas enquanto houver tempo não vou desperdiçá-lo com coisas efêmeras.

E para você? Quanto vale seu tempo? 

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