Parte I: Como viemos parar aqui? Nossa relação com o trabalho.
O ano mal acabou e ainda não cheguei a um balanço sobre o que vem acontecendo comigo e com o mundo nos últimos anos. Não está sendo trivial chegar a alguma conclusão ou elaborar um plano de ação para os próximos meses que virão, confesso. Nem tenho mais a pretensão de que exista essa resposta exata, definitiva e completa.
Aprendi com Simon Sinek lendo seu livro que ganhei de presente de um grande amigo este ano, o jogo infinito, que essa busca pela linha de chegada, pela vitória, pela resposta correta e definitiva está nos adoecendo. Literalmente.
Por isso busquei por uma única escolha, simples, mas não fácil: escolhi como pressuposto o Amor.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) há poucos meses oficializou o burnout como uma doença crônica e, portanto que entrou no hall da classificação internacional de doenças a partir de 01/01/2022. Motivos pra comemorar? Não exatamente. Explico-me… Por um lado, passamos a levar a sério os sintomas de esgotamento que vem nos varrendo feito um tsunami nos últimos meses. Isto é muito importante como ponto de partida para uma possível solução e esperança para uma séria discussão sobre o assunto.
Saímos do cruel julgamento do mimimi para o enfrentamento de um problema concreto. Finalmente entendemos enquanto sociedade que existe uma dor e precisamos tratá-la.
Por outro lado, quem está buscando a real causa dessa exaustão e agindo para de fato repensar crenças e comportamentos que nos levaram a chegar até aqui? No fundinho tenho receio de que, mais uma vez, vamos prescrever remédios para acalmar sintomas, aliviar o sofrimento e maquiar essa dor ao invés de olharmos a causa e buscarmos alternativas juntos para os futuros desejáveis de nossa sociedade.
Ainda tenho dúvidas se essa dor é grande o suficiente para nos fazer parar e repensar nosso rumo.
Somos produtos de um mundo linear, planejado, estruturado, em que conseguimos multiplicar e replicar referências de modelos de sucesso para continuar conquistando reconhecimento, riqueza, distinção social. Com a revolução industrial e a sua parente, a divisão internacional do trabalho, nos definimos pelo que fazemos, pelo nosso oficio. Pela parte que nos cabe desse latifúndio onde um mais um é igual a dois, sempre.
Se não bastasse simplificarmos nossa existência ao que produzimos, aos diplomas que temos na parede e às medalhas de honra que nos distinguem, aqueles que possuem capacidade analítica desenvolvida, possuem fluência em tecnologia e demonstram inteligência cognitiva acima da média ainda ganham estrelinha! Seu valor é maior que o dos outros.
Sem hesitar ouso dizer que a nossa ação é que move o mundo. Porém, sermos definidos e valorizados exclusivamente pelo que fazemos, pelo cargo que possuímos ou a função social que exercemos é no mínimo uma avaliação incompleta de todo o potencial que temos e do que somos em essência.
Isso nos leva a decisões muitas vezes equivocadas, pois os fins passaram a justificar os meios, os troféus viram o objetivo final e a jornada perde o sentido.
Buscamos sucesso e recompensas initerruptamente já que cada vez que conquistamos mais temos acesso a mais pessoas e possibilidades. Seguimos nos achando insuficientes e precisando provar mais, e mais, e mais. Conforme livro de Ryan Holiday “O EGO é seu inimigo” seguimos neste looping contínuo de comparação, frustração e conquistas.
E qual o maior símbolo desta conquista, já que o que fazemos nos define enquanto seres humanos dignos de afeto e respeito? Nosso trabalho.
E onde nos esgotamos para provar que somos incríveis e valemos a pena? Em nosso trabalho!
Chegamos até aqui conquistando muitas vitórias, alcançamos níveis de desenvolvimento imensuráveis, progressos e evoluções sociais concretos e inestimáveis. Se olharmos pra trás, nunca vivemos tão bem como atualmente! Como conquista da humanidade fomos capazes de erradicar algumas doenças, administramos outras, mais e mais pessoas possuem infraestrutura e oportunidades de construir uma vida melhor devido ao acesso impensável à educação e à informação que antes era monopólio da igreja e da aristocracia.
Chegamos longe, com mérito até aqui, porém nos confundimos… Confundimos o que somos com o que fazemos…